segunda-feira, 4 de março de 2013

A surpreendente cadela Lilica


Nada, ou melhor, pouca coisa, mas muito pouca coisa, me surpreende. Com o passar do tempo o solo do coração torna-se pedregoso, árido. Cheio de remendos, feridas ainda abertas, recapeamentos, decepções, traumas, cicatrizes. Tatuagens. Na sociedade contemporãnea dos homens ligeiros, da comunicação instantãnea, da informação, da política dos homens corruptos, dissimulados, sem palavras, sem ética, sem ideologia ou valores senão aqueles que dizem respeito ao seu próprio interesse egoísta. Nada, ou melhor, pouca coisa, me surpreende.

Dentre todas as espécies que vivem no planeta Terra, a pricípio apenas a espécie humana, nós, homens e mulheres, somos dotados de inteligência, de sensibilidade, de alma e compaixão. Pois bem. E o mundo é o que é e está como está!

Mas eis que em meio a sucatas de um ferro velho a lição não vem desse ser fantástico, dotado de inteligência superior, sensibilidade de alma, moral e compaixão. Vem de uma cadela. Uma "vira-lata". Em meio à sucata de um ferro velho no interior de São Paulo, na cidade de São Carlos (SP), descansa para mim  não apenas  um exemplo de solidariedade mas a prova cabal que, como diria o filósofo, há muito mais entre o céu e a terra que possa supor nossa vã filosofia!

"A cadela Lilica mora no local e divide o espaço com um cão, um gato, um galo, uma galinha e até uma mula. Todas as noites, os bichos têm o jantar garantido porque Lilica faz a parte dela." Um "animal" que transcende o instinto básico da sobreviência, o que Marx/Engels chama de ato primeiro, básico, do ser humano - a própria subsistência, depois de saciado, não come em excesso, nem a mais. Não estoca.  Compartilha!


Quando a tarde vai embora, a cadela cumpre rigorosamente uma missão. O destino é casa da professora Lúcia Helena de Souza, que cria 13 cachorros e 30 gatos, todos recolhidos da rua. Depois de servir o jantar da turma, a professora prepara uma marmita para Lilica.

"O encontro é pontual, ocorre sempre por volta das 21h30. A cadela mata a fome, pega a sacolinha com o alimento separado pela professora e segue de volta ao ferro velho. São dois quilômetros de caminhada na lateral de uma estrada bem movimentada. No escuro, a pista fica ainda mais perigosa, mas Lilica atravessa com segurança e em poucos minutos chega com o jantar dos outros animais."

Lilica aproximou a vida de dona Lucia Helena e a de Dona Neide, sua dona que a achou ainda filhote na frente do ferro velho. No ultimo sábado (20/03), Dona Neide participou do quadro "Agora ou Nunca" do programa Caldeirão do Hulk do apresentador Luciano Hulk que também já tinha visto reportagem sobre a cadelinha e convidou sua dona para participar, devido as condições de risco social que a mesma sobrevive, quase que sem condições nenhuma. Resultado, dona Neide ganhou R$ 30.000,00. 

Poucas coisas me surpreendem. Quase nada. Mas a cadela Lilica me fez pensar: "Se uma cadela pode agir com um senso de moral, de abnegação, de altruísmo, de grandeza tão grandes, por que nós... repito, por que nós... não temos?" Somos educados para sermos egoístas, não para dividir! Somos educados para sermos gladiadores de uma selva de pedra. Para sermos melhores. Para termos mais, acumularmos mais, sermos mais...mais..mais...mais.

Nada, ou melhor, pouca coisa, mas muito pouca coisa, me surpreende. Com o passar do tempo o solo do coração torna-se pedregoso, árido, cheio de remendos, feridas ainda abertas, recapeamentos, cicatrizes, decepções. Poucas coisas me surpreendem a não ser a cadela Lilica. Ela, uma cadela, mesmo sendo um animal, me fez retomar a possibilidade de credibilidade na restauração da espécie humana. E na minha!



 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe aqui sua opinião!