sábado, 10 de setembro de 2016

"MACACO!"

Carlos Almeida



 "Já sofri racismo quando era atleta de basquete. Já sofri racismo ao entrar dentro de Shoppings. Já fui discriminado até por frequentar ambientes onde alguns acham que negros não deveriam frequentar. O racismo, no Brasil, ocorre inclusive do negro para com outro negro. A Educação é sem sombra de dúvidas um dos principais mecanismos para se erradicar essa mazela vergonhosa do seio do povo brasileiro"



Certa vez, ainda nos idos da faculdade, quando me dirigia para uma escola onde lecionava como estagiário pela Secretaria  Estadual de Educação fui tomado por uma ocorrência inusitada. 

O ponto de ônibus onde eu descia ficava cerca de uns 5 minutos da escola. Então, como de costume, naquele dia, desci e no caminho ao passar em frente a uma escolinha acho que pertencente ao nível de ensino infantil, um garotinho na faixa de uns oito ou nove anos gritou bem alto de uma janela de primeiro andar  onde se encontrava: 

"MACACO"

Não posso deixar de expressar aqui ainda hoje ao lembrar a minha indignação mas podem ter certeza que muito mais indignação eu tive naquele momento. Virei-me para o rapazinho e tomado de ira, para a minha surpresa ao parar e encarar a janela de onde saíra o insulto me deparei com uma criança negra, de olhar saltitante como daqueles peraltas que um dia alguns de nós já fomos. 

Imediatamente uma série de referências teóricas se anteciparam a qualquer gesto ou censura que eu poderia fazer, principalmente as referencias as quais eu estava debruçado na época, que diziam respeito a questões como luta de classes, intelectual orgânico gramsciano, sujeito epistêmico, cultura de massas, o indivíduo enquanto reprodutor dos modelos preestabelecidos pela sociedade do capital, reestruturação produtiva etc. 



No entanto, de súbito foi tomado por uma das sensações mais fortes do que todas as relações inter-textuais que  referendassem meu arcabouço teórico e racional  a fim de explicar o fenômeno que leva uma criança negra de 8 anos a chamar um adulto que não conhece e trafega na rua de "Macaco" em um sentido pernicioso, discriminatório. Lembrei da família que tive e tenho, da formação e educação que recebi já no seio familiar e em questões de segundos equalizei o problema como um matemático que encontra uma resposta a seus cálculos complexos.

Respirei fundo, voltei ao meu caminho enquanto aquela criança sorria lá de cima, todo cheio de si, certo de que haveria ganho o dia  com sua desafortunada brincadeira. 

A bem pouco tempo um vídeo veiculado na campanha do "Criança Esperança" dizia, "Ninguém nasce racista. Continue criança". Eu diria, "ninguém nasce racista, eduque suas crianças também a não serem!"

Nenhuma criança de 8 anos chama um adulto de "macaco" sem que antes um adulto a houvesse chamado antes. E nenhuma criança negra de 8 anos, na sacada de uma escola infantil, sozinha, provavelmente em um intervalo de aula, chamaria a um adulto, transeunte, também negro, maior de idade, se essa representatividade não tivesse sido, em algum momento de sua vida, dada como exemplo testemunhado seja no abrigo do lar fragmentado, ou pela figura da mãe ou de um pai que não o souberam (nem sabem) educar ou em comunidade, feito por outrem, em suas relações sociais. 

E eu passo após outro, entendendo o desafio do que é ser educador, com um imenso sentimento de gratidão, pude identificar e reconhecer a importância da educação recebida antes de tudo em casa, pela família e a importância desta na formação do caráter do ser humano. 

 Já sofri racismo, discriminação quando era atleta de basquete. Já sofri racismo ao entrar dentro de Shoppings. Já fui discriminado até por frequentar ambientes onde alguns acham que negros não deveriam frequentar. O racismo, no Brasil, ocorre inclusive do negro para com outro negro. A Educação é sem sombra de dúvidas um dos principais mecanismos para se erradicar essa mazela vergonhosa do seio do povo brasileiro


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