O último livro de Vargas Llosa: radiografia sem diagnóstico
É um livro
triste, melancólico, angustiado. Vargas Llosa denunciando a vulgarização
da cultura: “a cultura, no sentido que tradicionalmente foi dado a este
vocábulo, está nos nossos dias a ponto de desaparecer. Talvez já tenha
desaparecido, esvaziada discretamente de seu conteúdo e este substituído
por outro, que desnaturaliza o que teve”.
O livro se chama A civilização do espetáculo,
edição original da Alfaguara. Nele Vargas Llosa reivindica fortemente o
sentido que ele dá à Ilustração, a que ele contrapõe a civilização do
espetáculo, definido por ele como:
“o
de um mundo em que o primeiro lugar na tabua de valores vigente é
ocupado pelo entretenimento e em que se divertir, fugir do
aborrecimento, é a paixão universal”.
Llosa
denuncia a banalização da cultura, a generalização da frivolidade e a
proliferação do jornalismo irresponsável “da fofoca e do escândalo”
no campo da informação.
Qual o
diagnóstico dele? Em primeiro lugar o bem estar social no ocidente, que
teria levado a uma grande abertura dos parâmetros morais, a começar pela
vida sexual. Com isso aumentou o ócio, como grande estimulo para as
industrias da diversão, promovidas pela publicidade, “mãe e mestra
mágica do nosso tempo”.
A
democratização da cultura também teria contribuído – o que teria tido “o
indesejável efeito de trivializar e adoçar a vida cultural, em que
certo “facilismo” formal e a superficialidade do conteúdo dos produtos
culturais se justificavam em razão do propósito de chegar ao maio
numero”. A quantidade teria triunfado sobre a qualidade, gerando
“demagogias”, com a temida “desaparição da alta cultura”.
A literatura
de maior sucesso na nossa época passou a ser a “literatura light”, a
critica literária teria praticamente desaparecido, propaga-se o
conformismo, a complacência e a autossatisfação. A cozinha e a moda
ocupam boa parte das secções dedicadas à cultura. “Os fornos, os fogões e
as passarelas se confundem dentro das coordenadas culturais da época
com os livros, os concertos e as operas, assim como as estrelas da
televisão e os grandes jogadores de futebol exercem sobre os costumes,
os gostos e as modas a influencia que antes tinham os professores, os
pensadores e (ainda antes) os teólogos.” Edmund Wilson deu lugar a Oprah
Winfrey.
A
publicidade foi preenchendo lugar deixado livre pela desaparição da
crítica, “convertendo-se esta em nossos dias não apenas em parte
constitutiva da vida cultural, como em seu vetor dominante”. A obra
literária passou a ser considerada um produto comercial, submetido aos
vaivens do mercado, “o preço passou a confundir-se com o valor de uma
obra de arte”. Se eclipsa o intelectual e os debates públicos que
interessam: “…na civilização do espetáculo, o intelectual só interessa
se faz o jogo de moda e se torna um bufão”.
Por aí segue
a radiografia que faz Vargas Llosa do que se transformou a cultura no
mundo contemporâneo. Pode-se concordar com quase toda radiografia que
ele faz. O que falta é o diagnóstico de por que isso se dá. A ausência
do capitalismo, da mercantilização da sociedade e da vida cultural, da
alienação como fenômeno central na sociedade de mercado, lhe impede de
chegar ao diagnostico real e profundo do por que dessa situação. Esse é o
limite da consciência de um liberal.
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