Autor da proposta indecente, Vicente Cândido é considerado "petista orgânico" e tem, entre seus amigos, sócios da empresa de telefonia, que tem interesse em resolver a situação de multas superiores a 10 bilhões de reais
Rodrigo Rangel
PROPINA - O deputado Vicente Cândido admite ter perguntado ao conselheiro Marcelo Bechara quanto ele cobraria para encampar na Anatel as pretensões da Oi. O petista entregou a Bechara documentos com a lista dos problemas da companhia a ser resolvidos urgentemente pela agência (Ailton de Freitas/Ag.Globo) |
No fim de 2008, uma canetada do então presidente Lula permitiu a
compra da Brasil Telecom pela Oi, uma das mais complexas e questionadas
transações do mercado brasileiro nos últimos tempos. A assinatura aposta
por Lula no decreto que abriu caminho para o negócio foi justificada
com um argumento repleto de ufanismo: era preciso criar um gigante
nacional no setor de telecomunicações para competir em condições de
igualdade com as concorrentes internacionais. A operação bilionária foi
cercada de polêmica por outras razões. Primeiro, porque a Oi fechou o
negócio graças a um generoso financiamento público. Além disso, a
empresa tinha e tem entre seus controladores o empresário Sérgio
Andrade, amigo do peito de Lula desde os tempos em que o petista era um
eterno candidato a presidente. E a mesma Oi, três anos antes, investira 5
milhões de reais na Gamecorp, uma empresa até então desconhecida
pertencente a um dos filhos do presidente. À parte as polêmicas, a
supertele nacional não decolou como planejado e o discurso nacionalista
logo caiu por terra -- e com a ajuda do próprio petista, que meses antes
de deixar o Planalto criou as condições para que a Portugal Telecom
comprasse uma parte da companhia.
Com o passar do tempo, porém, a Oi perdeu valor de mercado, viu
aumentar suas dívidas em proporções cavalares e hoje enfrenta sérias
dificuldades para investir, o que para uma empresa do ramo de
telecomunicações é quase como uma sentença de morte. O destino da
companhia é motivo de preocupação para o governo e para o ex-presidente
Lula. Em especial, pela possibilidade de o insucesso da empresa causar
danos políticos às portas de uma campanha presidencial em que o PT
pretende estender sua permanência no poder. Como explicar a ruína de um
megaprojeto liderado pela maior estrela do partido e bancado em grande
medida com dinheiro dos cofres públicos? Uma tarefa difícil, certamente.
É legítimo que haja um esforço para ajudar uma empresa nacional. É
legítimo que esse esforço também envolva agentes políticos. O que não é
legítimo é a solução do problema passar por lobbies obscuros, negociatas
entre partidos e até uma criminosa proposta de pagamento de propina a
um servidor público em troca de uma ajuda à empresa -- episódio que
aconteceu no início do mês nas dependências do Congresso Nacional, em
Brasília, envolvendo o deputado federal Vicente Cândido, do PT de São
Paulo, e o conselheiro Marcelo Bechara, da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel).
Indicado para o cargo pelo PMDB, em 6 de agosto Marcelo Bechara foi
ao gabinete do deputado depois de receber um telefonema do parlamentar
convidando-o para uma visita. Entre uma conversa e outra, Cândido
engrenou o assunto principal: a cobrança de multas bilionárias aplicadas
à Oi pela agência. Advogado por formação, Bechara é conhecido por sua
capacidade de formatar soluções jurídicas para questões aparentemente
insolúveis. Ele fora o relator de uma proposta que pode dar um alívio e
tanto ao combalido caixa da empresa e que será debatida em breve no
conselho diretor da Anatel. A proposta regulamenta a cobrança de multas
aplicadas às companhias telefônicas. As da Oi, atualmente, somam mais de
10 bilhões de reais -- uma cifra astronômica em todos os aspectos,
ainda mais se comparada ao valor de mercado da companhia, estimado em
menos de 8 bilhões de reais.
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